A concentração de renda de alto padrão na Zona 2 aparece como um dos vetores que explicam a transformação desse território.

  • Somando os segmentos A, AA e AAA, a massa de renda familiar ultrapassa R$ 221 milhões por mês.

Essa base de poder aquisitivo, apesar de distribuída em um número relativamente reduzido de domicílios, molda diretamente o tipo de cidade que se forma à beira-mar:

Mais verticalizada, mais estruturada e demandante de serviços, infraestrutura e projetos urbanísticos de maior complexidade

  • Para Sandra Moura, esse perfil de morador influencia fortemente o urbanismo e os serviços.

“Esse público demanda segurança e exclusividade, moldando uma paisagem que privilegia o privado sobre o público”.

  • “Isso força o urbanismo e os serviços a se adaptarem a um modelo de nicho, com criação de novas áreas de zoneamento e polos de serviços”.

“É fundamental utilizar instrumentos urbanísticos que promovam inclusão e mitiguem os impactos da segregação, garantindo que a infraestrutura de qualidade seja acessível para diferentes grupos sociais”, alerta.

Alisson Holanda faz avaliação semelhante sob a ótica do mercado imobiliário.

  • Segundo ele, a alta renda concentrada no litoral sul é uma oportunidade, mas também um desafio à política urbana.

“Quando falamos em famílias A, AA e AAA, estamos falando de poder de compra capaz de sustentar empreendimentos de alto padrão, escolas privadas, clínicas especializadas, gastronomia, escritórios e uma série de serviços sofisticados. Isso é ótimo para a economia local”.

  • “Mas, se esse ecossistema for desenhado apenas para dentro dos condomínios, nós criamos ilhas de excelência isoladas do restante da cidade”.

“O objetivo deveria ser exatamente o contrário: fazer com que esse ciclo de riqueza gere mais integração urbana, mais espaço público qualificado e mais oportunidades”, afirma o presidente do IRPB.

  • Para evitar que o eixo se torne um “gueto de alto padrão”, a arquiteta Sandra Moura defende políticas que incentivem o mix social.

“O mix social pode evitar a lógica de ‘guetos de alto padrão’. Incentivar que prestadores de serviços residam em áreas próximas, reduzindo deslocamentos e promovendo espaços urbanos compartilhados entre diversas faixas de renda, é uma estratégia importante”, argumenta.

  • Na mesma linha, ela ressalta que o caminho passa pelo adensamento qualificado e inteligente e afirma que é necessário garantir que novas construções não transformem ruas em corredores para carros, mas sim em espaços protegidos para pedestres, com ciclovias, arborização, fachadas ativas e praças estruturadas.

Defende ainda que os empreendimentos incorporem energia solar, jardins de chuva para filtragem da água pluvial, criação de corredores ecológicos e priorização do transporte coletivo e da mobilidade ativa, destacando que a integração entre arquitetura e infraestrutura é essencial.

Plano Diretor, ZH4 e limites de expansão

Do ponto de vista institucional, Altiplano e Portal do Sol ocupam posição estratégica nas normas de uso e ocupação do solo de João Pessoa.

  • O secretário de Planejamento de João Pessoa, Ayrton Falcão, lembra que não se trata de uma “terra sem lei”, mas de uma fronteira altamente regulada.

“O Altiplano e o Portal do Sol consolidam-se, de fato, como uma das principais fronteiras de desenvolvimento urbano de João Pessoa”.

  • “Do ponto de vista do planejamento, da expansão urbana, da mobilidade e das diretrizes do Plano Diretor, tratam-se de áreas com enorme potencial, mas que exigem atenção estratégica e integrada”, afirma.

O secretário explica que o Altiplano e o Portal do Sol são classificados predominantemente como Zona Habitacional 4 (ZH4) pela Lei de Uso e Ocupação do Solo (LUOS), mas que isso não significa liberdade total de ocupação.

  • Ele destacou que há restrições específicas de uso e densidade, relacionadas tanto à sensibilidade ambiental quanto à disponibilidade de infraestrutura básica, além dos limites impostos pela faixa de 500 metros da orla.

Segundo ele, o desenvolvimento nessas áreas só é sustentável quando compatibilizado com a capacidade de suporte ambiental e urbano.

  • Ayrton Falcão lembra que o Plano Diretor de João Pessoa “já estabelece como princípio a distribuição equilibrada de usos e intensidades de ocupação, para evitar tanto a ociosidade quanto a sobrecarga da infraestrutura, dos sistemas de transporte e do meio ambiente”.

“É uma visão de crescimento que busca otimizar recursos e evitar a dispersão urbana. Qualquer expansão, portanto, deve ser acompanhada de licenciamento ambiental, estudos de impacto e avaliações criteriosas para garantir a preservação dos ecossistemas locais.”

  • Ele destaca que a mobilidade é um dos pontos mais sensíveis para a expansão do Altiplano e do Portal do Sol.

Segundo o secretário, o aumento populacional tende a elevar significativamente a demanda por deslocamentos, o que mostra que o transporte individual não pode ser a única resposta.

  • Para ele, o futuro da região depende de um sistema de mobilidade que priorize integração, eficiência e modais sustentáveis.

“Estamos trabalhando, inclusive em parceria com o Governo Federal, em projetos que ampliem rotas e conexões estruturantes, como a ligação da Avenida Hilton Souto Maior às avenidas Beira-Rio e Epitácio Pessoa, além da implantação de calçadas amplas e acessíveis, ciclovias seguras e corredores exclusivos para o transporte público”.

“Os projetos dos viadutos que interligam Beira Rio, Altiplano e Miramar são parte fundamental dessa estratégia”, detalha.

  • Para o secretário de planejamento, o grande desafio é fazer com que a valorização imobiliária caminhe junto com a qualidade de vida.

“O Altiplano e o Portal do Sol são vetores essenciais para o futuro de João Pessoa”.

  • “O Plano Diretor e a LUOS oferecem instrumentos mais modernos e precisos para promover um crescimento ordenado e ambientalmente responsável — muito diferente de fases anteriores de expansão”.

Na análise do secretário Ayrton Falcão, a revisão do Plano Diretor aprofunda princípios de sustentabilidade, compensações urbanísticas e mecanismos de controle que antes não estavam tão detalhados.

  • “Agora precisamos garantir que essa expansão seja constantemente monitorada, ajustada às necessidades reais da população e compatível com a capacidade ambiental da região”.

“Isso exige investimentos permanentes em infraestrutura, políticas de mobilidade que priorizem o transporte coletivo e os modais ativos, além de uma gestão ambiental rigorosa”.

  • “Assim, a valorização imobiliária deve caminhar junto com a qualidade de vida, consolidando um modelo de cidade mais compacta, sustentável e justa — alinhada ao que João Pessoa busca construir para as próximas décadas”, resume.

Pesquisa como ferramenta de decisão

  • Alisson Holanda destaca que o papel da pesquisa, realizada pelo Instituto Ranking PB em parceria com o Grupo Prospecta, é justamente oferecer uma espécie de radiografia fina da cidade, capaz de apoiar tanto políticas públicas quanto decisões de investimento.

“Trabalhamos com dados oficiais e com uma metodologia que segmenta João Pessoa em 14 zonas de demanda, cruzando renda, densidade, padrão dos domicílios e dinâmica populacional”.

  • “No caso da zona 2, fica claro que estamos diante de um território com renda muito acima da média, forte presença de famílias de alta renda e crescimento consistente”.

“Isso ajuda o poder público a planejar infraestrutura e ajuda o mercado a dimensionar melhor seus projetos, evitando superofertas ou vazios urbanos”, afirma.

  • Ele observa que a leitura do estudo não deve ser feita apenas pela ótica do luxo.

Na leitura de Alisson Holanda, o objetivo vai muito além de mapear onde está o topo da pirâmide, mas compreender como esses vetores se conectam com o restante da cidade, quais impactos geram na mobilidade, de que forma o adensamento pode financiar infraestrutura e como a expansão do alto padrão pode coexistir com políticas de moradia, inclusão e preservação ambiental.

Fronteira de desenvolvimento – e de escolhas

  • A combinação de indicadores deixa claro que o eixo Altiplano–Portal do Sol representa, hoje, a fronteira de desenvolvimento mais dinâmica de João Pessoa:

Concentra parte relevante da renda de alto padrão, cresce em ritmo acelerado, atrai projetos arquitetônicos emblemáticos e se tornou prioridade nas discussões do Plano Diretor.

  • Mas, como lembram Sandra Moura e Ayrton Falcão, a forma como essa fronteira será ocupada nos próximos anos definirá o skyline da cidade e o próprio modelo de urbanismo que João Pessoa pretende adotar:

Uma cidade orientada pelo automóvel ou pelo pedestre, por condomínios fechados ou por espaço público qualificado, por ilhas de prosperidade ou por um tecido urbano mais integrado.

  • Nas palavras de Alisson Holanda, a pesquisa mostra que o vetor está diante de uma encruzilhada estratégica.

“Os números provam que o Altiplano e o Portal do Sol já são a fronteira de desenvolvimento da Capital”.

  • “A questão agora é se vamos transformar essa fronteira em um laboratório de cidade sustentável, compacta e bem conectada, ou se vamos repetir erros de outros lugares, com adensamento desordenado e mobilidade colapsada. Os dados estão sobre a mesa; o próximo passo depende das escolhas que fizermos como cidade”, conclui.

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